Quando peguei neste livro na biblioteca não sabia que estava a levar para casa um thriller fantástico. Tendo como personagem principal o médico David Hunter, é o primeiro de vários livros centrados no médico forense. Nesta primeira história, David deixa Londres e instala-se numa aldeia isolada para exercer medicina geral. No fundo, está a fugir de uma tragédia pessoal e de uma cidade que nesse momento é um espelho do caos que o consome.

Acontece que nessa aldeia pacata, e depois de já estar instalado há algum tempo, é cometido um assassínio macabro. É encontrado o corpo de uma mulher em condições horríficas e, quase por acaso, o polícia responsável pela investigação vem a saber que David é um dos médicos forenses mais respeitados do país. Quase exigindo a sua participação, o médico acaba por se envolver numa investigação que, infelizmente para si e para toda a comunidade, só ali começou.

É daquelas histórias extremamente bem construídas, com muitas reviravoltas inesperadas. O leitor é constantemente surpreendido num enredo nada óbvio e muito bem interligado, num livro que é o exemplo de como o suspense deve ser construído. Estou ansiosa por ler mais livros desta saga.

A Química da Morte
De: Simon Beckett
Ano: 2006
Editora: Presença
Páginas: 304

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.


Bem... eu ia ficar furiosa por terem rabiscado e furado um livro desta forma... mas pronto, vale a intenção. E é uma forma original de fazer o pedido que muitos anseiam. Parabéns aos noivos! (se ela não tiver ficado chateada, como eu ficaria. Com livros não se brinca!)


Maria Luísa é gorda. Isso é inegável. Ela sabe, toda a gente sabe. E desde cedo levou com as bocas que, infelizmente, são normais nas tenras idades. Chamaram-na todos os nomes, sofreu de bullying, mas curiosamente nada abalou a sua determinação. A sua inteligência e perseverança contribuíram para um crescimento que acabou por ser normal para as vezes que a tentaram inferiorizar.

Neste livro conhecemos as diversas fases da sua vida, em cada parágrafo apresentadas brilhantemente por uma divisão de uma casa. Com vários saltos temporais (que talvez sejam o aspecto menos positivo por se tornar confuso), acompanhamos Maria Luísa desde a infância à idade adulta. Filha de pais emigrados em África e que tiveram de regressar à metrópole após o 25 de abril, este é também um bom retrato dessa época.

Sozinha em Portugal para estudar, ela passa pelas fases complicadas, pelas amizades tóxicas, más influências, e também pelas paixões. Ser gorda fá-la passar algumas vergonhas e ver-se em situações incompreensíveis e inacreditáveis para quem nunca passou por isso. É também, por isso, um livro de coragem e que marca a diferença desde o momento em que olhamos para as actuais prateleiras das livrarias.

Numa escrita em tom leve mas determinado, ficamos rapidamente fãs desta rapariga-mulher que, acima de tudo, não desiste dos seus sonhos e não deixa que a sua aparência seja um estandarte da sua pessoa.

A Gorda
De: Isabela Figueiredo
Ano: 2016
Editora: Caminho
Páginas: 288

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.
Se viajar de comboio entre Lisboa e Braga até ao fim do mês, no Alfapendular, vai ter uma surpresa. Ao escolher o seu lugar, vai também estar a escolher um livro que o vai acompanhar durante a viagem. A maioria são contos, histórias curtas mais fáceis de ler. E entre eles encontram-se, por exemplo, Machado de Assis ou Edgar Allan Poe.

A iniciativa é da Cetelem em parceria com a CP. Chama-se "Viagens Com Livros" e vem do Programa de Apoio à Leitura "Tem Tudo a Ler". Uma ideia fantástica para promover a leitura que devia, sem dúvida, ser estendida tanto na data como nos trajectos. Se houver uma pessoa por dia que pegue num dos 301 livros (para os 301 lugares disponíveis) e sinta o prazer da leitura, já será uma vitória.

Via Visão.

Estou constantemente a ouvir isto... "mas tu só pedes livros? não te fartas?" Claro que não! Encham-me de livros! É a prenda útil que nunca desilude! (a não ser quando me deram um da Margarida Rebelo Pinto :/ )

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Antes de mais, este é um trabalho jornalístico formidável, realizado ao longo de bastante tempo e ouvindo o relato de muitas, muitas pessoas, todas elas ligadas de uma forma ou de outra ao desastre de Chernobyl.

Estes discursos foram colocados no livro tal como foram ditos, portanto estamos a "ouvir" as vozes puras, carregadas da tristeza, do medo, da estranheza que os protagonistas sentiram. Conhecemos todo o tipo de intervenientes no desastre, desde as mulheres que viram os seus maridos - bombeiros, polícias, militares... - serem chamados imediatamente para o centro da acção sem saberem onde e por quanto tempo iriam; passando pelos mais velhos que se recusaram a abandonar as casas e os bens e que acabaram por ver tudo à volta morrer; até às futuras mães que esperavam no ventre as consequências negras de Chernobyl.

É claro que é impressionante e que muitas palavras nos moem por dentro. A mim, dois aspectos em especial me fizeram impressão. Primeiro, ter percebido, só agora, do escrutínio que estas pessoas sofreram. Ninguém os queria por perto. A população tornou-se refugiada sem ter para onde ir. Chamavam-lhe "os radioactivos" e outras coisas muito piores, e toda a gente - toda - desde crianças na escola aos mais velhos, foram segregados, postos de parte, olhados de esguelha, numa situação que dura mesmo nos dias de hoje.

Em segundo, os animais. Com a fuga da população, estes ficaram para trás. Gatos, cães, tartarugas, porcos, vacas, cavalos. Todos. Ficaram sem comida, sem água, em solo radioactivo aguardando a morte. Até que foi decretado que deveriam ser mortos (a tiro, para manter a distância) e as terras tornaram-se um palco de morte, com animais mortos por todo o lado, que não podiam ser queimados (por causa da radioactividade espalhada através do fumo) e não houve outro remédio senão enterrá-los em valas (alguns deles ainda vivos, por já não existirem balas suficientes).

Um momento da nossa história que nunca devia ter acontecido. Uma leitura aconselhável aos que querem conhecer melhor os intervenientes directos.
A autora foi distinguida com o Prémio Nobel em 2015.

Vozes de Chernobyl
De: Svetlana Aleksievitch
Ano: 1997
Editora: Elsinore
Páginas: 336

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.
É ou não é? 😊



Foi numa feira de antiguidades que comprei esta edição bem antiga do livro "Nascido a 4 de Julho". Neste, o autor conta a sua própria história, desde o tempo em que era um jovem cheio de força e energia que sonhava lutar pelo seu país, até se ter tornado num retornado da guerra do Vietname, paralisado do peito para baixo.

A acção vai saltando entre o passado e o presente, dando ênfase à impressionante vontade de viver do jovem Kovic, a quem não faltavam prémios por excelência no desporto. É-nos contada a sua infância e adolescência, e conhecemos as suas amizades, brincadeiras, namoros e interesses. Tudo para nos dar uma base da personalidade activa deste homem. Assim que teve idade para se alistar, quis representar a América ao mais alto nível, assim ele pensava, e lutar de arma na mão no Vietname.

Quis o destino que este homem sobrevivesse, mas completamente paralisado do peito para baixo. Reduzido a uma cadeira de rodas, percebemos como a sua masculinidade é afectada, como não se sente um ser humano inteiro e como lamenta a decisão que tomou, ainda para mais depois de verificar como é tratado. Testemunha que não há condições para os lesados da guerra, que acabaram por viver em hospitais degradantes e sem ajuda digna, vistos mais como os coitadinhos que se querem escondidos e calados do que como heróis.

Antes orgulhoso por ter defendido o seu país, Kovic torna-se num homem que vai lutar pelo fim de uma guerra sem sentido, não hesitando em dar a cara, e o seu pouco corpo, aos media, em todo o lado que tivesse oportunidade.

É uma história impressionante que, centrada num indivíduo, nos faz ver muito para além dele, que nos mostra outros verdadeiros destroços humanos da guerra, que são aqueles que viram coisas abomináveis e que sobreviveram para relembrá-lo, ainda por cima sofrendo no corpo as horríveis consequências de uma guerra muito questionada.

É uma edição antiga com letras pequenas e com algumas gralhas, o que dificulta um pouco a leitura, e existem alguns devaneios incompreensíveis de Kovic pelo meio do livro, mas tirando isso aconselha-se a leitura.

E que se complete com a visualização do filme, com Tom Cruise no principal papel. Um filme de 1990 que já é um clássico.

Nascido a 4 de Julho
De: Ron Kovic
Ano: 1976
Editora: Publicações Europa-América
Páginas: 140

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.
É um quiz da Wook que pode encontrar aqui e que lhe vai dizer que tipo de leitor é... Não se esqueça de apontar as respostas! Eis o que me calhou:

MAIORIA E 
Tem a certeza que não é da famíia do Sherlock Holmes? E do Poirot? É um desvendador nato de mistérios e dilemas e não tem medo de livros assustadores! Não suporta finais sem sentido e leu de uma rajada só toda a coleção da Agatha Christie. Lembra-se quando se deliciou com O Cão de Baskervilles ou com A Rapariga no Comboio?

Bem, ainda não li as últimas duas referências, mas sim, adoro mistério e dilemas!! :)

Eu seria apanhada imediatamente!😄


E boa segunda-feira para todos os leitores :)



A história começa numa Feira de Emprego. Centenas de desempregados madrugaram e estão na fila do evento para serem os primeiros a entrar e a agarrar as oportunidades. Enquanto esperam, algumas pessoas socializam e conhecem-se, incluindo uma mulher que teve de levar o filho bebé e o homem que está atrás dela e a ajuda com a criança.

Nisto, um carro aproxima-se a alta velocidade. É um Mercedes, mas ainda na escuridão poucos dão por isso. Só ouvem e acabam por sentir o carro que não pára, que lhes passa por cima. Que mata algumas pessoas e deixa mazelas para sempre noutras. É um verdadeiro massacre, que muito faz lembrar alguns recentes ataques terroristas. Os desempregados, que ali estavam numa réstia de esperança, foram desprovidos de toda, alguns até de vida, numa cena icónicamente sádica e macabra mesmo ao estilo do meu querido Stephen King.

O carro foi encontrado vazio e sem pistas não muito longe dali. O autor não foi apanhado, nem havia a menor desconfiança. Agora, algum tempo depois, o detective encarregue da investigação está reformado e começa a receber mensagens de alguém que se identifica como o autor e que no fundo quer brincar com ele num jogo do gato e do rato que pode levar a sérias consequências.

Um livro que não desaponta, cheio de mistério e naquele estilo que nos leva a querer ler mais e mais. Stephen King é especialista nisso... Destaca-se ainda o perfil psicológico do assassino. O homem tem tantos pormenores de destaque naquela mente perturbada que vale a pena a leitura só por isso. Uma história de investigação policial com algo de doentio e de demente.

Sr. Mercedes
De: Stephen King
Ano: 2014
Editora: Bertrand
Páginas: 472

Disponível no site Wook.
A nossa pontuação: ★★★★☆
Recordando o jornalista e autor que nos deixou recentemente, deixamos uma citação de Baptista-Bastos presente no Jornal de Negócios em 2009, que muito diz sobre os nossos dias, as relações de hoje e os tempos frenéticos que vivemos em busca de não sei o quê, esquecendo-nos do que é importante.

Que descanse em paz e que as suas palavras inspirem os que por cá vão ficando.

"A nossa sociedade está a desmoronar-se e ninguém lhe acode. Os laços sociais estão a desaparecer, substituídos por um sistema de valores em que impera a vacuidade, o poder da «competitividade» como força motriz - e não é. Há tempo para tudo, diz o Eclesiastes. Mas a verdade é que os «tempos» foram pulverizados pela urgência de não se sabe bem o quê. A frase mais comum que ouvimos é: «Não tenho tempo para»; para quê? A correria mina as relações de civismo e de civilidade; está a roer os alicerces da família; a família deixou de ser o núcleo das nossas próprias defesas; e vamos perdendo o rasto dos nossos filhos, dos nossos amigos, dos nossos camaradas, dos nossos companheiros. A azáfama nos locais de trabalho é o sinal das nossas fragilidades e dos nossos medos. Estamos com medo de tudo, inclusive de confiar em quem, ainda não há muito, seríamos capazes de confidenciar o impensável."


Uma belíssima homenagem ao amor pelos livros! Uma tatuagem bem original, com uma composição excelente e imenso significado.


Hoje em dia a tecnologia está em todo o lado e na maioria das vezes não conseguimos evitá-la... mas podemos disfarçá-la! Esta capa para portátil é um mimo e mata um pouco as saudades dos nossos amigos livros. Giríssima!




Heinrich Böll, Prémio Nobel em 1972, é conhecido pela sua escrita dotada de uma clareza tão crua e dilacerante como a sua consciência política. Em "O Anjo Mudo" Böll fala-nos de um jovem militar alemão e do seu regresso em 1945 à sua cidade fragmentada e destruída, onde as ruínas do Terceiro Reich assombram mais o espírito dos homens do que as paredes das casas em pedaços.

Hans, um jovem recrutado, sem outra escolha do que seguir a sentença militar, chega-nos neste livro com fome, com traumas e fantasmas, mostrando o outro lado da Segunda Guerra Mundial. A educação (a História) é tão rápida nos seus julgamentos de valor, que é fácil deixar cair no esquecimento estes jovens, estas famílias, mulheres, crianças, pais, que sofreram com devastação causada nas suas vidas após os bombardeamentos, as mortes, e a ocupação do território no final da guerra.

No meio da desolação Hans encontra o amor e quem sabe até a fé, diria mesmo a esperança de um dia ser merecedor de alguma paz, consolação e perdão, no meio da austeridade da perda e da miséria. Regina é a mulher que o acolhe, saindo do luto de um filho morto para salvar um militar que, à força do contexto e do julgamento, nunca será um herói aos olhos de ninguém : para os seus é um pária ilegal, para os outros um criminoso.

Não é de estranhar que este livro não tenha sido publicado na data da sua conclusão em 1951, por despertar memórias que se queriam enterradas num passado demasiado recente e doloroso para uma nação que já perdera tanto de si mesma. Apenas em 1992, já depois da morte do autor, "O Anjo Mudo" ganhou voz e contou o outro lado humano de um dos períodos mais atrozes da história mundial.

Quanto mais lemos, mais vemos, mais sabemos, sobre as guerras que assolam e assolaram o nosso mundo, mais simples é perceber que não há vencedores. Todos os que perdem - sejam vidas, alma, valores morais, em contextos de total desumanidade e desumanização, são vítimas; e a qualificação de "os bons" e "os maus" é injusta por pecar no erro de esquecer que a natureza humana tem um pouco de ambos e que não nos compete julgar com uma simplicidade embrutecida, mas sim tentar compreender e melhorar para que as atrocidades que julgamos não se repitam por novas radicalizações da verdade.

Este é um livro honesto. Tão honesto como a verdade deve ser, com o seu respeito pelos factos, sim, mas acima de tudo com o seu respeito pelo Homem, qualquer Homem, sempre.

Uma lição sobre a Humanidade.

O Anjo Mudo
De: Heinrich Böll
Ano: 1992
Editora: Bibliotex Editor S.L. (trad. cedida por Edições Asa)
Páginas: 174

A nossa pontuação: ★★★★★

Num bairro de respeito (Arlington Park) vivem algumas mulheres que dedicam a sua vida à família, aos filhos e maridos, algumas às suas carreiras. Todas são diferentes, mas têm em comum algumas frustrações, desejos que nunca se irão cumprir e um modo de vida que escolheram e que umas acataram como o certo, e outras sonham com o que a vida poderia ter sido e não foi.

O enredo passa-se ao longo de um dia na vida destas mulheres, entre saídas umas com as outras, jantares e convívios que correm menos bem, momentos com os filhos e outros de algum desespero e confusão, mas também de agradecimento. A acção salta entre umas e outras, mostrando-nos pormenores na vida destas mulheres que por vezes se cruzam.

É um livro leve e fácil de ler, mas ao mesmo tempo é um desafio porque na verdade a trama não nos leva a lado nenhum. A autora mostra-nos a vida como ela é, e a acção não caminha para nenhum ponto crucial e impactante, para nenhuma reviravolta mirabolante. Isto é a descrição simples, mas sincera, e por isso, interessante, da alma feminina e da resignação, ou não, a um estilo de vida.

Livro finalista do Orange Prize 2007.

Arlington Park
De: Rachel Cusk
Ano: 2007
Editora: Edições Asa
Páginas: 240

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.