Ren tem 12 anos e vive no orfanato de Santo António desde que se lembra. Não tem uma mão, e não sabe como a perdeu, assim como não sabe nada sobre o seu passado e como foi parar ali. Tal como todos os seus colegas do orfanato, sonha em encontrar uma família para não ter de ir para o exército quando atingir a maioridade. Respondendo às suas preces, um dia, aparece Benjamin Nap, que alega ser seu irmão. Conta uma história rebuscada sobre o modo como ele perdeu a mão e sobre a razão de ele ali estar. E o prior, agradecido por ter menos uma boca para alimentar, liberta Ren para ir com aquele desconhecido.

O miúdo, confuso, lida com sentimentos díspares. Por um lado, está triste por deixar os seus amigos para trás, e a vida que sempre conheceu e onde está confortável. No entanto, sente que esta é a oportunidade de se conhecer a si próprio, a sua história, a sua família. No entanto, à medida que se afasta do orfanato com Benjamin, muitas coisas estranhas vão acontecendo e teme que tenha sido apanhado numa teia de mentiras onde é apenas um peão.

Tenho mixed feelings sobre este livro. Acabei de o ler, sim, foi interessante o suficiente para o acabar. Mas fiquei com demasiadas perguntas por responder. Mesmo em relação ao ambiente, sabe-se que se passa na Nova Inglaterra, mas mais nada. Falta um certo contexto histórico e social para percebermos alguns pontos, até mesmo comportamentais. Há também algumas personagens que aparecem para salvar o dia, como que por magia, e não chegamos a saber nada sobre elas. Para um leitor mais lógico, como eu, deixa algo a desejar.

Uma coisa que me irritou profundamente foram os comentários de capa. Sabemos que são um isco, mas a comparação com Charles Dickens e Harry Potter é o maior de todos. É que não tem nada a ver, para além do facto de ser uma aventura e, também, não fossem os episódios de violência, catalogaria este livro como infanto-juvenil.

Não é de todo o meu género de literatura, mas teve suspense suficiente para me agarrar e a personagem principal, Ren, é realmente cativante.

O Bom Ladrão
De: Hannah Tinti
Ano: 2008
Editora: Edições Asa
Páginas: 288

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.

Alexey Ivanovitch é o jovem perceptor dos filhos de um general russo que se encontra com bastantes dívidas. O general espera casar brevemente e receber uma herança para continuar a prosperar. Tem uma sobrinha, Polina, pela qual Alexey está loucamente apaixonado, mas não é o único - vários homens ricos pretendem desposá-la, o que também poderia representar um alívio financeiro para o general.

O general, Alexey e a restante família e amigos próximos encontram-se na Alemanha, numa área que fica terrivelmente perto de casinos. Terrivelmente, porque Alexey já teve problemas com o jogo no passado e receia perder a cabeça e apostar o pouco que tem na roleta. Quando Polina lhe pede para arriscar uma considerável soma no jogo para poder pagar dívidas, Alexey luta com sentimentos contraditórios - o bichinho do jogo que vive em si quer arriscar, mas teme perder, e ainda por cima não se trata do seu dinheiro.

A insistência da sua amada acaba por ganhar e Alexey vê-se novamente na mesa de jogo, e a sentir o que outrora sentiu - uma ganância que o faz querer mais e mais, uma cegueira que o impede de ver quando deve parar, um isolamento do que se passa à sua volta e das vozes que o aconselham, uma loucura inexplicável e uma desilusão tremenda quando as coisas não correm de feição.

Este é um clássico incontornável da literatura, mas não é o meu livro preferido de Fyodor Dostoyevsky. As partes da narrativa sobre o jogo são soberbas, e para isso contribuíu o facto de o próprio autor ter sido viciado no jogo. Aliás, este livro foi escrito com o objectivo de pagar precisamente dívidas de jogo. Ninguém melhor para descrever o que sente um jogador e para nos transmitir a alienação, a alucinação e o alheamento relacionados com a experiência.

No entanto, na minha opinião, a restante narrativa foi vítima desta pressa do autor, visto que se debruça de um modo desnecessário sobre outras temáticas, nomeadamente a sua paixão por Polina, que nunca chegamos a perceber muito bem e porque é que tem tanto tempo de antena; ou a existência de outros personagens que não chegam a contribuir significativamente para a história.

Há também momentos mais satíricos, cómicos e de boa disposição, sendo um dos pontos altos, para mim, o aparecimento da velha senhora 'generala' a quem todos chamam "Avó", que tem uma grande fortuna e estão todos a contar com a mesma quando ela morrer, e no entanto ela "decide" não morrer tão cedo e, para além do mais, vicia-se também ela na roleta. É engraçado assistir à crescente preocupação dos seus descendentes à medida que o dinheiro vai voando na mesa de jogo.

Um livro que é acima de tudo um olhar sobre a auto-destruição e sobre a maneira como o vício pode corromper uma alma, que teve inúmeras adaptações, seja para cinema, televisão, rádio, entre outras.

O Jogador
De: Fyodor Dostoyevsky
Ano: 1866
Páginas: 168
Editora: Editorial Presença

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.

Joaquim Heliodoro é um homem único. Usa um fato completo desde tenra idade, e tem hábitos e costumes que já não se usam. Com uma cultura acima da média, é um apaixonado por História e por compreender tudo o que pode. As suas habilidades sociais não são nada por aí além, e manteve-se, desde sempre, solteiro e com poucos ou nenhuns amigos, parecendo extremamente deslocado onde quer que vá.

Quando ganha uma soma avultada de dinheiro, Joaquim não está com meias medidas e compra um palacete acastelado com o objectivo de o transformar em hotel. Trabalhando com um arquitecto, os dois conseguem pôr o projecto de pé apesar das inúmeras desavenças - afinal, Joaquim é um homem à antiga com gostos difíceis de realizar e de rebater.

Torna-se então um homem orgulhoso da sua propriedade, que gosta de apreciar diariamente aquele local mágico que sempre admirou toda a sua vida e que muita curiosidade lhe suscitou. As texturas antigas, balaustradas e colunas, os frondosos jardins, os balcões com vistas magníficas, a biblioteca, os recantos, a mobília de época que conseguiu reunir, os grandes espelhos. E como pessoa única que é, também é esquisito com os seus hóspedes, mantendo os típicos turistas bem longe, apelando à vinda daqueles que sabem apreciar a arquitectura, a beleza e a tranquilidade.

A leitura não é fácil - o preciosismo do autor, as suas entusiásticas descrições devido à exploração histórica minuciosa sobre o local, fazem com que existam grandes blocos de informação que, sem a devida pré-disposição, poderemos não apreciar. É o meu caso, que tenho de estar com um certo mindset, e como tal o início do livro foi difícil de superar. Depois, alguns factos que foram introduzidos viraram o rumo das coisas.

Um deles foi o surgimento de uma aura pornográfica, que pode parecer tema que não se arruma aqui, mas que nos parece natural após a estranheza inicial. Joaquim Heliodoro é um homem com taras que enlouquece com o voyerismo, e o entrosamento entre a sua capacidade de observação geral com as descobertas pessoais que vamos fazendo sobre ele, misturadas com alguns segredos que nos vão sendo revelados sobre portas e passagens secretas que permitem que dê asas ao seu fetiche, vão fazendo com que compreendamos este homem e dão origem a situações engraçadas e surreais que não imaginávamos ao início. Depois, duas mulheres importantes vão tomando também o seu espaço na narrativa - Margareta, uma hóspede italiana sensual que lhe desperta uma sede adormecida; e Manuela, a gerente, intrometida, uma mulher mais jovem que nunca pensou poder despertar-lhe interesse.

É uma leitura muito interessante, de um autor que talvez conheçam de crónicas do Público ou da apresentação de alguns programas documentais na televisão, infelizmente falecido em 2016.

Hotel
De: Paulo Varela Gomes
Ano: 2014
Editora: Tinta da China
Páginas: 320

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.
Vá, esta livraria não tem culpa quando os autocolantes promocionais que tem se ajustam completamente ao assunto... 



;) 



O universo sombrio de Edgar Allan Poe está a ser recriado num cenário perfeito para o efeito - a Quinta da Regaleira, em Sintra. O espetáculo ocorre ao ar live às sextas e sábados à meia-noite até 18 de agosto.

Parece ser um espetáculo muito interessante, num local mítico que não podia ser mais adequado ao autor e que promete desvendar muitos mistérios e ter muita interação com o público, que será decisiva para o desenrolar da improvisação.

O evento, denominado Nocturnus, tem o preço de 10€, mas acedendo à bilheteira online já não existem bilhetes disponíveis. Talvez os interessados ainda consigam comprar no local. Vale a pena tentar!


Tertuliano Máximo Afonso é um professor de História solteiro, que vive sozinho, não é muito dado a socializações e tem uma certa mágoa por carregar um nome tão distintivo. Um dia, é-lhe recomendado um filme. Ele, que não é nada dado à magia do cinema, aceita a recomendação, para desafiar o marasmo em que se encontra.

Qual não é o seu espanto quando repara que um dos figurantes da película é a sua cópia chapada... Espantado e temeroso, decide-se a alugar vários filmes da mesma produtora de forma a encontrar novamente aquele rosto que parece o seu reflexo absoluto. Conforme vai reencontrando aquele homem noutros filmes, mais nervoso fica, porque não é apenas a cara - têm a mesma voz, as mesmas cicatrizes e no mesmo sítio, os mesmos sinais - e, mais do que qualquer outra coisa, a situação torna-se assustadora e é premente para Tertuliano encontrá-lo, confrontá-lo, dizer-lhe que no mundo só há espaço para um de si.

Esta é a premissa que desencadeia uma data de eventos que têm tanto de surrealista como de engraçado ou pesaroso, culminando no inesperado. Uma história que se bebe, daquelas que é impossível parar de ler. Tertuliano é uma personagem tão bem delineada, tão humana, que transporta tanto por dentro daquilo que não dizemos, que tão cedo não o irei esquecer.

É um romance fantástico, com um sentido de humor refinado, com aquela narrativa que imita a oralidade bem característica de Saramago e que torna a cadência da acção inimitável. Embora o tema dos "duplos" ou "sósias" não ser inovador e de já ter sido explorado por inúmeros e grandes escritores, garanto aos futuros leitores que nunca leram uma história assim.

O livro foi adaptado para o cinema (com o nome original Enemy) e lamentavelmente ainda não vi, mas verei muito em breve por duas razões - estou imensamente curiosa para ver a adaptação em si, que não deve ter sido nada fácil; e, porque Jake Gyllenhaal.

O Homem Duplicado
De: José Saramago
Ano: 2002
Editora: Porto Editora
Páginas: 336

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.

Jonathan Harker está na Transilvânia por motivos profissionais, para lidar com a compra de uma casa em Londres por parte do misterioso Conde Drácula. É recebido num portentoso castelo situado numa lindíssima área florestal, e o anfitrião, apesar de ter estranhos hábitos, aparenta cordialidade. Conforme os dias passam, Jonathan vai-se apercebendo de que nunca viu o conde comer, que nunca aparece de dia, que parece esfumar-se de um momento para o outro, e o caldo entorna definitivamente quando não o vê num reflexo de um espelho e depois testemunha a sua descida do castelo pela parte de fora, com uma facilidade tal que parecia uma aranha.

Sem saber se algo se passa ou se a sua mente lhe está a pregar partidas, Jonathan, ao tentar sair, percebe que, mais do que um prestador de um serviço, é um prisioneiro. O pânico apodera-se dele quando o conde o obriga a escrever cartas para o sócio e para a noiva com conteúdo adulterado.

Já em Inglaterra, a sua noiva Mina começa a estranhar primeiro o conteúdo das cartas que recebe, e depois, a falta de notícias por parte de Jonathan. Ainda para mais, pernoita na casa da sua melhor amiga Lisa, e esta, sofredora de sonambulismo, desaparece numa noite. Mina procurou a amiga por todo o lado e ao longe conseguiu vislumbrar um vulto branco, amparado por uma outra figura de negro, que desapareceu com a sua aproximação. A partir dessa noite, Lisa nunca mais foi a mesma pessoa, adoeceu gravemente e as pequenas feridas no seu pescoço não auguravam nada de bom.

Este é o ponto de partida e o facto que faz com que ilustres personagens se juntem para descobrir a verdade e que tudo façam para acabar com uma ameaça que pode afectar o mundo inteiro.

Apesar de ficcional, a narrativa faz-se apenas e só com os registos dos diários das personagens e com alguns apontamentos de notícias de jornais, o que não é, de todo, uma forma fácil de escrever, e que foi concerteza um grande marco no séc. XIX. Fazer com que todos os factos batam certo e que sigam uma linha temporal a partir de relatos escritos em forma de diário é um feito só ao alcance dos génios. A leitura, como tal, não é propriamente fácil. É um livro maçudo e temos de nos habituar a ler imensas vozes, que é como ter vários narradores para uma história só.

Não há como contornar também o facto de aqui, neste livro fantástico, ter nascido o pai de todos os vampiros. Uma personagem como há poucas, que tem sobrevivido através dos séculos e que marcou a cultura popular como poucas. Com uma caracterização baseada em lendas e folcrores, reúne, de forma consensual, as características chave destas criaturas mitológicas que, infelizmente nas últimas décadas, têm vindo a ser deturpadas de tal forma que já em nada se parecem com as crenças seculares.

Um clássico incontornável obrigatório para os fãs de literatura de todos os géneros, que deu origem a inúmeras adaptações em várias vertentes artísticas. No cinema, perde-se a conta aos filmes que directa e indirectamente se basearam nesta história, mas destacam-se os incontornáveis, míticos, Nosferatu (1922) e Dracula (1931).

Drácula
De: Bram Stoker
Ano: 1897
Editora: Publicações Europa-América
Páginas: 424

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.
A iniciativa chama-se Flybraries e chegou aos voos nacionais. A companhia aérea Easyjet "equipou" os seus aviões com 17.500 cópias de livros infantis, traduzidos para 7 idiomas, incluindo português. Uma verdadeira biblioteca voadora que tanto os miúdos como os pais vão decerto gostar.

Entre os livros disponíveis podemos encontrar Alice no País das Maravilhas, O Livro da Selva, Peter Pan, entre outros. Portanto, coisas que muitos adultos, como eu, não se importariam de ler ou reler também...

Uma iniciativa de louvar, visto todos sabermos a importância da leitura. Para além disso, sendo um espaço fechado e tendo as crianças de ocupar o tempo, pegarem num livro para se entreterem poderá fazer toda a diferença, e poderá nascer um novo hábito naquelas que são mais resistentes à leitura. De acordo com os mais recentes resultados do PIRLS, os alunos portugueses do 4º ano pioraram o seu rendimento na leitura desde 2011 e estão abaixo da média europeia.

Muitos parabéns à Easyjet! Podem conhecer mais dados e a iniciativa aqui.


Linnet Ridgeway é uma jovem que aparentemente tem tudo: é bonita, sofisticada, elegante, inteligente, tem olho para o negócio, é pretendida por inúmeros homens, e as mulheres normalmente rendem-se à sua simpatia, aura genuína e charme. Para além disso, é herdeira de uma das maiores fortunas do país e, prestes a atingir a maioridade, pensa em casar.

Quis o destino que se apaixonasse justamente pelo namorado da melhor amiga, e é assim que faz uma inimiga. Linnet e Simon acabam por casar, para desgosto da sua amiga, Jacqueline, que passa a persegui-los para todo o lado, de forma a conseguir estragar o tempo de qualidade do jovem casal.

A situação vai tomando proporções perigosas e, sem medo de cair no ridículo, Jacqueline consegue saber onde o casal vai passar a lua-de-mel e, sem vergonha, segue-os para o Egipto. Acontece que Hercule Poirot está de férias e segue nesse mesmo barco, tornando-se um pouco o confidente da perturbada jovem, que tenta acalmar o melhor que pode, mas a sua mágoa é enorme e o desejo de vingança maior ainda.

Numa noite em que os humores se exaltaram e em que Jacqueline tinha bebido demais, Linnet aparece morta. É o choque para os passageiros daquele cruzeiro. A resposta para o crime parece óbvia para alguns, mas é claro que nada é fácil nem o que parece à primeira vista.

Agatha Christie tem aqui uma das suas mais célebres histórias, que nos agarram não só pelo fabuloso mistério desenvolvido e pelas voltas e reviravoltas na narrativa, mas também pelas fantásticas personagens a que dá corpo. Todos os que se encontram naquele barco são suspeitos, e todas as personagens são peculiares, particulares, com características únicas tão bem delineadas que conseguimos imaginá-las perfeitamente.

O leitor é sabiamente levado a desconfiar das várias versões contadas, desenvolvendo o espírito crítico, integrando também um pouco o papel de investigador, tão bem endereçado ao nosso bem conhecido Poirot.

O livro foi adaptado ao cinema em 1978, num muito conhecido clássico que conta com os talentos de Bette Davis, Mia Farrow ou Maggie Smith, apenas nomeando alguns; e está a ser desenvolvida nova versão que estreará nos cinemas em 2019, continuando o trabalho de Um Crime no Expresso Oriente, saído o ano passado, pelo mesmo realizador, Kenneth Branagh.

Morte no Nilo
De: Agatha Christie
Ano: 1937
Editora: Edições Asa
Páginas: 270

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.