Hotel - Paulo Varela Gomes

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Joaquim Heliodoro é um homem único. Usa um fato completo desde tenra idade, e tem hábitos e costumes que já não se usam. Com uma cultura acima da média, é um apaixonado por História e por compreender tudo o que pode. As suas habilidades sociais não são nada por aí além, e manteve-se, desde sempre, solteiro e com poucos ou nenhuns amigos, parecendo extremamente deslocado onde quer que vá.

Quando ganha uma soma avultada de dinheiro, Joaquim não está com meias medidas e compra um palacete acastelado com o objectivo de o transformar em hotel. Trabalhando com um arquitecto, os dois conseguem pôr o projecto de pé apesar das inúmeras desavenças - afinal, Joaquim é um homem à antiga com gostos difíceis de realizar e de rebater.

Torna-se então um homem orgulhoso da sua propriedade, que gosta de apreciar diariamente aquele local mágico que sempre admirou toda a sua vida e que muita curiosidade lhe suscitou. As texturas antigas, balaustradas e colunas, os frondosos jardins, os balcões com vistas magníficas, a biblioteca, os recantos, a mobília de época que conseguiu reunir, os grandes espelhos. E como pessoa única que é, também é esquisito com os seus hóspedes, mantendo os típicos turistas bem longe, apelando à vinda daqueles que sabem apreciar a arquitectura, a beleza e a tranquilidade.

A leitura não é fácil - o preciosismo do autor, as suas entusiásticas descrições devido à exploração histórica minuciosa sobre o local, fazem com que existam grandes blocos de informação que, sem a devida pré-disposição, poderemos não apreciar. É o meu caso, que tenho de estar com um certo mindset, e como tal o início do livro foi difícil de superar. Depois, alguns factos que foram introduzidos viraram o rumo das coisas.

Um deles foi o surgimento de uma aura pornográfica, que pode parecer tema que não se arruma aqui, mas que nos parece natural após a estranheza inicial. Joaquim Heliodoro é um homem com taras que enlouquece com o voyerismo, e o entrosamento entre a sua capacidade de observação geral com as descobertas pessoais que vamos fazendo sobre ele, misturadas com alguns segredos que nos vão sendo revelados sobre portas e passagens secretas que permitem que dê asas ao seu fetiche, vão fazendo com que compreendamos este homem e dão origem a situações engraçadas e surreais que não imaginávamos ao início. Depois, duas mulheres importantes vão tomando também o seu espaço na narrativa - Margareta, uma hóspede italiana sensual que lhe desperta uma sede adormecida; e Manuela, a gerente, intrometida, uma mulher mais jovem que nunca pensou poder despertar-lhe interesse.

É uma leitura muito interessante, de um autor que talvez conheçam de crónicas do Público ou da apresentação de alguns programas documentais na televisão, infelizmente falecido em 2016.

Hotel
De: Paulo Varela Gomes
Ano: 2014
Editora: Tinta da China
Páginas: 320

A nossa pontuação: ★★★☆☆
Disponível no site Wook.

2 comentários:

  1. Ao longo dos anos li as crónicas do Paulo Varela Gomes e até cheguei a comprar um livro que reunia alguns dos seus textos, que eram um verdadeiro oásis no deserto de ideias dos cronistas deste país. Agora que descobrimos o universo das bibliotecas municipais é mais fácil chegar aos livros:)
    Tomei nota da sua sugestão.
    Bom fim-de-semana!

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    1. Por acaso acho que até lhe pode agradar, até mais do que a mim :) Um bom dia!

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